terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

As religiões do mundo

Ao significado de religião pode-se responder através do batismo numa igreja, da adoração ao templo budista, dos judeus com sua Torá frente ao muro das Lamentações em Jerusalém ou ainda dos peregrinos muçulmanos na Caaba em Meca. É possível responder se há algum comum nesses fenômenos? As ciências da religião procuram investigar esse aspecto da religião, não para descrever plena e exaustivamente como um crente o faria, mas para entendê-la de uma perspectiva externa (Cf. GAARDER; HELLERN; NOTAKER 2005, p. 15).
O papel significativo que as religiões do mundo possuem em relação à vida social e politica são diversos. Ouve-se dos conflitos entre católicos e protestantes na Irlanda do Norte, de cristãos contra muçulmanos, muçulmanos e hinduístas, da guerra entre budistas e hinduístas. As seitas religiosas extremistas nos Estados Unidos e no japão praticam terrorismo. Ao mesmo tempo representantes de religiões fazem ajudas humanitárias em diversos lugares do mundo (Cf. GAARDER; HELLERN; NOTAKER, 2005, p. 15). Em fim no fenômeno religioso há muitas contradições, no que se refere a um objetivo específico para as religiões.
Pode-se ainda sugerir como definição do fenômeno religioso a observação do contexto histórico e cultural de cada religião, visto que reuni-las num só conceito seria praticamente impossível. Outro caminho seria o que Nathan Söderbom (1866-1931) sugere como religiosa ou piedosa a “pessoa para quem algo é sagrado”. Rudolf Otto destaca o sagrado como o “inteiramente outro”, uma força, um sentimento de espanto, que tem o poder de atrair e do qual não se pode resistir. Mircea Eliade propõe uma relação sagrado versus profano. O sagrado para ele é “separado e consagrado” e o profano é o que está fora do templo (Cf. GAARDER; HELLERN; NOTAKER, 2005, p. 19-20).
Outra noção que pode nos levar a uma explicação é fazendo referência às ideias do crente:
O crente tem idéias bem definidas sobre como a humanidade e o mundo vieram a existir, sobre a divindade e o sentido da vida. Esse é o repertório de idéias da religião, que se expressam por cerimônias religiosas (ritos) e pela arte, mas em primeiro lugar pela linguagem. Tais expressões lingüísticas podem ser escrituras sagradas, credo, doutrinas ou mitos (GAARDER; HELLERN; NOTAKER, 2005, p. 21).
O complexo das grandes religiões atuais configura-se em quatro grandes correntes: às originárias da Índia – hinduísmo e budismo –; da China – confucionismo e taoísmo –; do Oriente Médio – judaísmo, cristianismo e islamismo – e as tribais. As da Índia caracterizam-se pelo místico, as da China pelo sábio e as do Oriente Médio pelo profeta e as tribais pela oralidade. Em todas elas passaram por origem, tendo uma forma primitiva, uma meia-idade e sua transformação a partir do contato com a modernidade. Atualmente vive-se a pós-modernidade, momento de transição para o terceiro milênio a incoerência e a contradição parecem presentes no mundo das religiões (Cf. KÜNG, 2004, p. 15).
Ainda que se observem diferenças há entre elas semelhanças. Além das grandes questões sobre origem, destino, sofrimento, culpa, padrões de vida, ações e sentidos da vida e da morte; existem as repostas dadas pelas religiões que há proximidade. Elas possuem mensagem, por meio da fé, e caminho de salvação regrada por uma visão, uma atitude e uma norma para a vida (Cf. KÜNG, 2004, p. 16).
Segundo Küng deve-se ter uma visão objetiva frente às religiões. Ir à busca de vestígios que conduzem à paz e a um etos que oriente nas explicações do complexo mundo das religiões. Um esforço em direção à paz constitui um dos objetivos de sua obra. Suas perguntas sobre os sentidos da religião são fundamentais. Essas são resumidamente:
  • Porque bilhões de pessoas são religiosas?
  • Qual a origem e a natureza desses fenômenos?
  • Que desenvolvimentos tiveram?
  • Quais suas constantes éticas?
  • O que os separam e o que os une?
  • Quais suas contribuições para o etos da humanidade? (Cf. KÜNG, 2004, p. 16-17).
Não se pretende com isto uma espécie de unificação das religiões. Suas diversidades são importantes para uma contribuição nos enriquecimentos mútuos. Pretende-se, pelo contrário, um entendimento universal entre as religiões em vista de alcançar um etos comum da humanidade. O etos é uma dimensão dentro de diferentes religiões, ou seja, um aspecto comum entre elas. Não que se queira uma pretensa escolha de uma das religiões ou que se vá criar uma em substituição às demais. Deve-se pretender um empenho pela paz entre as religiões do mundo. Assim que pode-se afirmar que:
Não haverá paz entre as nações, se não existir paz entre as religiões. Não haverá paz entre as religiões, se não existir diálogo entre as religiões. Não haverá diálogo entre as religiões, se não existirem padrões éticos globais. Nosso planeta não irá sobreviver, se não houver um etos global, uma ética para o mundo inteiro. (KÜNG, 2004, p. 17).
Fundados nessas ideias de religiões que buscam realizar sacrifícios ou oferendas, ritos dos mais diversos, com ou sem organização, possuindo um ou vários deuses, mas que possuem o sagrado de comum em seus resultados, pode-se experimentar o místico, através de orações, rezas, meditações, incorporações de espíritos ou de orixás. Pode-se também observar as religiões em suas escrituras e mitos sagrados. Essas são revelações, as quais foram recebidas por profetas ou pessoas escolhidas, que funcionam como manifestações indicadoras de respostas às questões existenciais e estabelecimento de convivências.
É nessa tentativa de entender a efervescência religiosa do mundo pós-moderno e observar os hiatos, os vazios da existência humana e dos valores, inclusive de dar sentido à própria existência e à morte é que se pode trilhar um caminho com múltiplas respostas. Visava-se entre os anos 60 e 70 – século XX –, em vista do processo de secularização observado por diversos estudiosos, um contínuo processo de marginalização da Religião e por fim sua dessacralização e desaparecimento do sagrado. Havia os que apostavam numa religião purificada e secular e ainda os que devotavam no declínio irreversível da religião ao que a modernidade se opunha. (Cf. MARTINELLI, 1995, p. 271-72).
Já no final dos anos 80, a secularização é discutida e criticada. Estudiosos como Sabino S. Acquaviva, Peter Berger, Bryan R. Wilson, Thomas Luckmann, Niklas Luhmann, já haviam apontado para discussões teóricas da secularização sem, no entanto, prescindir da religião e sua relação com a sociedade. Viram-se nesta época novos fenômenos religiosos, seja pelo despertar de novos movimentos religiosos, seja pela crise do capitalismo.
Como pretende Acquaviva há na secularização uma espécie de eclipse. B. R. Wilson “quis defender a pretensão ocidental de conseguir captar a evolução religiosa em vigor dentro de um quadro conceitual comum, assegurado pela teoria da secularização” (MARTINELLI, 1995, p. 324).
No entender de T. Luckmann não se pode afirmar que o declínio do Cristianismo tenha causa no advento de ideologias laicistas e ateias. Para ele “a hodierna marginalidade da religião-de-igreja e sua secularização interna são, na verdade de um amplo processo, no qual jogam uma parte decisiva, tanto a excessiva institucionalização da Religião como as transformações globais da sociedade” (MARTINELLI, 1995, p. 302).
P. Berger nos traz a noção da sociedade como produto da atividade humana e define o humano como ser instável e versátil. Neste sentido para ele a cultura é instável e a religião seria “uma empreitada humana através da qual um cosmo sagrado é criado” (MARTINELLI, 1995, p. 298). Para esse autor a secularização é o “processo com que a religião perde sua autoridade tanto em nível de instituições como em nível de consciência humana” (MARTINELLI, 1995, p. 290).
No entender de Luhmann não há declínio da religião e nela não há uma função integradora, mas na nossa sociedade complexa “ela realiza a função geral de representação simbólica da totalidade e de redução da complexidade segundo a modalidade interpretativa”. É importante destacar que para este autor “a independência dos subsistemas da Religião é o autêntico significado da secularização” (MARTINELLI, 1995, p. 310-11).
Aqui não nos cabe teorizar sobre todas as discussões sobre o sentido da religião na modernidade ou pós-modernidade. Pretende-se focar sobre o sentido dado à Religião e à secularização em sua relação com o sagrado. Noutro aspecto pode-se ainda destacar as condições em que este sagrado relaciona-se com o sentido de etos dado por Küng. Busca-se um sentido ético diferente da simples interiorização de valores, mas de uma construção de sentido mais amplo para o entendimento das religiões do mundo em suas diversidades.


REFERÊNCIAS
FONAPER – Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Ensino religioso: capacitação para um novo milênio: O fenômeno religioso nas tradições religiosas de matriz oriental, Caderno 8, Caderno de Estudos Integrantes do Curso de Extensão – a distância – do Ensino Religioso,Brasília, [s/e], 2000a.
FONAPER – Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Ensino religioso: capacitação para um novo milênio: O fenômeno religioso nas tradições religiosas de matriz ocidental, Caderno 6, Caderno de Estudos Integrantes do Curso de Extensão – a distância – do Ensino Religioso,Brasília, [s/e], 2000b.

GAARDER, Jostein. HELLERN, Victor. NOTAKER, Henry. O livro das religiões, São Paulo, Companhia das letras, 2005.

KÜNG, Hans. Religiões do mundo: em busca de pontos comuns, Campinas, Versus editora, 2004.

MARTINELLI, Stefano. A religião na sociedade pós-moderna: entre secularização e dessecularização.

O ALCORÃO, Base de dados: http://www.livroesoterico.com.br, Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.do>, acesso em: 01 ago 2012.

O QUE É BUDISMO, Templo Zu Lai e BLIA – Associação Internacional Luz de Buda, 2006.

SMITH, Huston. As religiões do mundo: Nossas grandes tradições de sabedoria, São Paulo, Cultrix, 2007.


VALLET, Odon. Uma outra história das religiões. São Paulo, Globo, 2002.

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